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Deus é Amor: O Pai ama o Filho na comunhão do Espírito Santo (Um estudo sobre a Trindade)

 Deus é amor. Deus também é eterno. Quem é o objeto do amor de Deus? Se Ele é amor desde antes de criar o mundo, Ele não é simplesmente amor ao homem, já que por toda a eternidade antes de criar o homem, Ele já era amor. Então, quem Deus ama eternamente? Quem, desde toda eternidade, tem sido a definição de Deus, por ser o objeto do amor que é característica do Seu Ser? Deus é amor, mas amor a quem?


 “(...) pois me amaste antes da fundação do mundo.”

(Jo 17:24)


 Desde muito antes de criar o homem e os seres vivos, desde antes das estrelas e do sol, desde antes da própria luz e de todos os anjos terem sido criados, por toda a eternidade, o Pai ama o Filho. Não houve um só instante sequer em que Deus Pai não amasse o Filho, não houve, nunca, nem haverá, nenhum momento em que o Filho não esteja com o Pai sendo amado. Nem pode haver: Deus é amor; Deus é o Pai amando o Filho, e o Filho amando o Pai. Essas duas pessoas divinas são um só Deus, porque não há Pai se não houver Filho, nem Filho se não houver Pai: Um é intrinsicamente ligado ao outro, de modo que são um só. Um só Deus, que é amor porque o Pai ama o Filho.


 Não só o Pai ama o Filho, Jesus, mas lhe dá o Espírito sem medida. Jesus é o Cristo, que significa o Ungido, o que implica Aquele que unge e a Unção.¹ Deus eternamente ama Jesus e nesse amor o unge com a Unção que revela Sua alegria. Jesus é a Palavra, o que implica a Voz e o Fôlego. Deus eternamente ama Jesus e nesse amor pronuncia Seu Nome, levando-o a ser conhecido em toda existência pelo Seu Sopro. O Pai ama o Filho, e nesse amor dá o Espírito, o dom do Pai ao Filho. O Filho ama o Pai, no poder do Espírito Santo. O Pai ama o Filho tão supremamente que o ama em comunhão, na comunhão do Espírito Santo, e o Filho ama o Pai com tanta intensidade que o ama na comunhão, na comunhão do Espírito Santo, que os ama, de modo que não há Pai sem compartilhar Seu amor ao Filho com o Espírito, nem Filho se não o fizer com o Espírito, da mesma forma que o som de uma palavra não existe sem ar, de modo que os três são um. Um só Deus, que é amor e, portanto, comunhão: o Pai amando o Filho na comunhão do Espírito Santo.


 Dessa forma — com o eterno amor do Pai ao Filho na doação do Espírito, o eterno amor do Filho ao Pai no poder do Espírito, o eterno amor do Espírito na comunhão com o Pai e com o Filho — Deus é amor em Si mesmo, e portanto, é plenamente satisfeito e supremamente feliz. Mas, se é assim, porque Deus criou o homem? Se já era satisfeito, porque criar? Não por necessidade, mas por generosidade. 


“(...) para o louvor da glória da sua graça (...)”

(Ef 1:6)


 Deus, sendo puro amor e a fonte eterna de alegria, tem em si mesmo o Seu maior tesouro, e assim Se honra e Se glorifica: o resplendor da glória do Pai é o Filho, e por isso Ele o glorifica e lhe dá o Espiríto sem medida, demonstrando o quanto o valoriza, e o Filho valoriza o Pai sobre todas as coisas, e por isso faz a Sua vontade no poder do Espírito, glorificando o Pai. Assim, Deus valoriza supremamente a Si mesmo, e glorifica a Si mesmo em decorrência do Seu sublime amor. Ele é o que há de mais belo, por isso Ele glorifica a Si mesmo, na valorização infinita de cada Pessoa como tesouro de amor das outras. Então, em generosidade infinita, Deus criou o homem para louvor da glória da Sua graça; Deus criou o homem de modo que o homem, mera criatura finita, seja capaz de contemplar a beleza infinita de Deus e o glorifique também, sendo imagem de Deus ao, como Ele, tê-lo como maior tesouro e portanto fonte infinita de satisfação. O homem foi criado de modo que possa conhecer a riqueza da graça de Deus e assim glorificá-lo, exaltá-lo e louvá-lo, tê-lo por precioso, e, à semelhança de Deus Pai encontrar na satisfação com o Filho fonte de eterno prazer, e à semelhança do Filho encontrar no Pai fonte de eterna beleza, e à semelhança do Espírito encontrar nessa comunhão bem-aventurança sem fim. Portanto, o homem foi criado como convite à eterna alegria de Deus: encontrar suprema satisfação nEle, como Ele tem nEle mesmo.²


 No entanto, o homem não manteve seu coração na fonte de satisfação suprema e pecou, de modo que em vez de valorizar Deus passou a desprezá-lo. Em outras palavras, em vez de amar o Filho como o Pai ama, cuspiu em Sua face; em vez de apreciar o Pai sobre todas as coisas como o Filho faz, virou as costas para Ele; em vez de ter comunhão com o Pai e o Filho no Espírito, ultrajou-o. Diante disso, o Pai não amaria o Filho se não tomasse providências contra estes que O odeiam, e o Filho não amaria o Pai se não expulsasse os que O desonram, e o Espírito não Os amaria se não se afastasse deles, que odeiam Deus, pois o amor, ao amar, protege o amado.


"Disse então o senhor da vinha: Que farei? Mandarei o meu filho amado; a ele talvez respeitarão.

Mas quando os lavradores o viram, arrazoaram entre si, dizendo: Este é o herdeiro; matemo-lo, para que a herança seja nossa.

E lançando-o fora da vinha, o mataram. Que lhes fará, pois, o senhor da vinha?"

(Lc 20:13-15)


 Não defender o amado contra as ofensas é o contrário do amor, é indiferença. Justamente por isso o Senhor Jesus ceava com pecadores e repreendia fariseus: Ele é amor e veio salvar, então não podia tolerar que os fariseus fossem um obstáculo aos que se entregavam a Ele. Se o Senhor fosse gentil com os pecadores e ao mesmo tempo gentil com aqueles que os ofendiam, Ele seria ofensivo por consentimento. Em outras palavras, o amor é o reconhecimento do amado como, em algum sentido, valioso; assim, o próprio ato de permitir que alguém o trate como insignificante é considerá-lo insignificante, de modo que, pela própria definição, tolerar desrespeito ao amado é não amar.

 

 Elevando isso até Deus, o Pai ama o Filho, e por isso quando o Filho é ofendido, o Pai se ira.³ Por isso, ao rejeitar o Filho, que o Pai estima sobre tudo, o homem merece ser expulso da comunhão para a qual foi criado e receber a retribuição proporcional à ofensa que cometeu. A condenação é um ato de amor — um ato de defesa ao amado ofendido.


 Qualquer que confessar que Jesus é o Filho de Deus, Deus permanece nele, e ele em Deus. E nós conhecemos, e cremos no amor que Deus nos tem. Deus é amor; e quem permanece em amor, permanece em Deus, e Deus nele.

(1 Jo 4:15-16)


 Deus é amor, e criou o mundo como expressão do amor que Ele já é desde toda a eternidade: o amor do Pai ao Filho na comunhão do Espírito Santo. Nos salvos, é o convite à alegria suprema no reconhecimento da Sua beleza eterna; nos perdidos, é a demonstração da preciosidade infinita do amado. 



Notas


¹ Paráfrase de Irineu de Lyon


² Ou, em outras palavras: O que Deus quer é a Sua própria glorificação, e "Deus é mais glorificado em nós quando estamos mais satisfeitos nEle".


³ Quase uma paráfrase: "Quem crê no Filho tem a vida eterna; o que, porém, desobedece ao Filho não verá a vida, mas sobre ele permanece a ira de Deus." (Jo 3:36)




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